Presidente do Ibram: Mineração como política de Estado

SÉRGIO AGUIAR MATOS – A palavra é de especialista. Paulo Camillo Penna, diretor-presidente do Instituto Brasileira de Mineração (Ibram) e porta-voz do setor no Brasil, faz um balanço sobre o mercado de mineração no contexto pós-crise.

O executivo, que embora examine com cautela a perspectiva de mudança na legislação do setor, anunciada pelo governo federal, está otimista com a possibilidade de uma melhora no desempenho.

Uma nova avaliação de investimentos deverá ser feita pelo Ibram até o início de 2010, e os números devem superar US$ 47 bilhões previstos em março deste ano. Paulo Camillo critica as limitações de prazo para pesquisa e concessão de lavras, esboçadas na nova legislação.

Considera, no entanto, a criação de uma agência reguladora e de um conselho nacional como demonstração de que, finalmente, o setor poderá ter uma política de Estado e ser tratado como plataforma estratégica para o desenvolvimento.

Que retrospecto o senhor faz da mineração no Brasil?

A história econômica da mineração, diferentemente da realidade de outros setores, tem seu grande desenvolvimento em ciclos. Cresceu na Primeira Guerra Mundial, também no período de 1939 a 1950, na década de 70, e de 2001 a 2008. Ou seja, a atividade expande-se a em ciclos a cada 20 ou 30 anos. A própria expressão “descobriu a mina”, faz parecer que o setor está sempre crescendo, o que não é verdade. Só para se ter uma idéia, somente o minério de ferro, que responde por 2/3 de investimentos, de 1980 a 2000, percebeu queda no preço de 2% e, de 2000 a 2008, queda de 7% . Nem mesmo o principal mineral brasileiro está livre. Ao contrário, está sujeito a grandes oscilações. Recentemente, quando tínhamos boas projeções e perspectivas, fomos frustrados com a crise financeira mundial.

Pode detalhar mais o momento atual?

Fazemos projeções de investimentos no setor mineral com períodos de cinco anos. Para o período de 2009 a 2013, revisamos a mesma previsão algumas vezes. Em julho de 2007, pipocou a crise do sub-prime americano, e ainda assim o setor mineral desconheceu esta turbulência, e subimos de US$ 28 para US$ 32 bilhões. Depois, em janeiro de 2008, elevamos a previsão para US$ 48 bilhões. Tivemos ainda perspectivas melhores que foram reavaliadas para baixo com a crise financeira global, e hoje falamos em investimentos na casa dos US$ 47 bilhões, ou seja, US$ 9,4 bilhões por ano. No contexto desses números, é importante lembrar que o mundo crescia antes em torno de 4%. No ano passado tivemos o mundo dividido entre população rural e urbana, fato determinante para se ter a demanda crescente de commodities minerais, e a China que promove crescente emigração do meio rural para o meio urbano. A China continua puxando o setor e é hoje o primeiro comprador mundial de ferro, carvão, aço, alumínio, cobre, níquel e segundo em petróleo, ficando atrás apenas dos EUA. Existe um processo de urbanização e nossas exportações em minério de ferro, por exemplo, mostram isso. Em 2008, a China comprava 34,2% e hoje compra 55,7%.

E os demais países?

Só no 3º trimestre, a Europa começa a recuperar o crescimento. A Europa e as Américas respondiam por 40% das exportações de minério, e isso tinha caído. Agora começa a recuperar. A China, ao contrário, permaneceu com compras aquecidas. A Alemanha, por exemplo, comprava 9,1% do nosso minério e em agosto desse ano registrou 2,6% que recentemente subiu para 3,1%. A França comprava 4%, caiu para 1,3% em agosto, e agora em setembro registrou 1,4%. A Itália foi de 3,8 para 1,5. O Japão de 12,7% para 8,3%, e está se recuperando. Existe, portanto, um processo de recuperação generalizado. Em relação ao Brasil, a proposta do Ibram é fazer até o final do ano ou início de 2010 um novo levantamento do setor, pois já há indícios de melhora. Minas Gerais, por exemplo, que sentiu muito a crise, antes previa US$ 18 bilhões de investimento. A previsão foi recalculada durante o pico da crise para US$ 13 bilhões e agora já temos informações que os investimentos dão conta de US$ 15 bilhões. O Brasil está crescendo de maneira sustentada, está saindo da crise. Estamos com números parecidos com os de 2006, acho que vai demorar bastante para chegar na situação de 2007 ou 2008. É cedo para falar, mas o setor vem se recuperando, em que pese dificuldades.

Os investimentos da mineração estão concentrados em Minas Gerais e no Pará. Existem projetos para a descentralização desses investimentos?

Hoje já estamos pulverizando o que antes era restrito a Minas e o Pará. Agora também temos atuação crescente na Bahia e em Goiás. Estamos aumentando também a atuação em Santa Catarina. Mesmo em São Paulo, temos os agregados da construção civil. Aliás, este setor não viu a crise. As obras públicas, dentro do PAC ou da construção civil de forma geral, só tiveram crescimento. O cimento, por exemplo, tinha projetado crescimento de 5% para 2009 e deve superar isso em 2010. Esses são minerais de consumo doméstico que não conheceram crise nos últimos seis ou sete anos. Outra observação importante é que a mineração tem a característica da rigidez locacional. Dá onde está. A atividade tem um papel de estado, seja na construção da infra-estrutura, seja para criar as condições que viabilizam a exploração mineral. Nos dois casos, a atividade é indutora do desenvolvimento na medida em que em todos os lugares em que atua o IDH é bem acima da media do Estado em que está.

Como o senhor avalia a evolução das questões ambientais do setor de mineração nos últimos anos?

A única atividade que tem previsão constitucional de recuperação ambiental é a mineradora. As empresas e o setor têm isso como fator, mas também a questão da ética social, etc. Esta percepção de que a mineração não recupera o ambiente é atrasada, fora de contexto temporal. O setor tem despontado em relação a este assunto desde os anos 70, quando nasceram os conceitos básicos sobre preservação do meio ambiente. A mineração busca padrões inclusive acima do que está ai. Algumas tecnologias desenvolvidas no Brasil são referências mundiais. E isto não é bom mocismo, mas um fator de preocupação e também de competitividade.

A imagem do setor de mineração acompanha a evolução das questões ambientais?

A gente luta ainda contra falta de informação e tenta corrigir o problema de imagem, que está associado ao garimpo, aliada ao fato de que a mineração não é bonita aos olhos, ainda que ocupe 5% da área de concessão. Salta aos olhos a alteração do terreno, em que pese a promoção da recuperação dessa área e os benefícios diversos que a atividade traz. Hoje lutamos para melhorar a imagem do setor, e dar a informação de que a mesma área que está sendo objeto de exploração será transformada em lugares para lazer ou outras explorações. Hoje existem áreas em grandes centros urbanos que outrora foram áreas de exploração mineral, como o parque do Ibirapuera e a Raia da USP, em São Paulo, ou a Ópera do Arame, em Curitiba.

Como o senhor está acompanhando a mudança do marco regulatório da mineração por parte do governo?

O que existe é que o governo quer fazer uma nova legislação do setor mineral. Nós pensamos que a atual legislação tem coisas a mudar, mas ainda assim abriga dispositivos modernos e que satisfaz o setor como um todo. Num primeiro momento, o setor ficou reticente com a possibilidade desta mudança, sobretudo, porque o setor não foi convidado para participar desse processo. Agora, o governo disponibilizou documento sobre a mudança para o setor. Estamos discutindo. Há a vontade de se criar o Conselho Nacional de Política Mineral e a Agência Reguladora de Mineração, que apoiamos, na medida em que o setor pode apoiar uma política de mineração que o Brasil nunca teve e considerar o setor como plataforma estratégica para o crescimento. Temos, todavia, outros aspectos mudança para analisar com cautela.

Quais, por exemplo?

Por exemplo, a limitação dos prazos para pesquisa e concessão de lavra, em que o governo optou por um dispositivo temporal para que ocorram as duas atividades. No caso da pesquisa, busca limitar-se para cinco anos, enquanto que na lavra para 35. É importante lembrar que o determinante muitas vezes não é o tempo, mas o preço do commodities. Cada projeto de mineração é um projeto de mineração. Não há que se criar uma regra geral, pois o depósito mineral é diferente um do outro. A gente entende que o governo persegue evitar a especulação, mas consideramos que seja possível obter o mesmo objetivo com, por exemplo, dispositivos econômicos. Ou seja, aumentar a tributação enquanto a empresa estiver lá. Portanto, se há uma mina de cobre, que não é altamente rentável, ela vai ficar mais adiantada em função do. Como já disse, é uma discussão que esta havendo agora, estamos todos debatendo com o Ministério das Minas e Energia que colocou o dia 30 de novembro data limite para receber propostas na forma de uma consulta pública. Até o momento temos apenas alguns conceitos e tivemos reuniões para clarear determinadas dúvidas. Estamos pleiteando ao menos uma minuta do texto para termos certa previsibilidade do que de fato irá mudar.

E a questão da elevação da carga tributária sobre o setor?

O governo separou os assuntos: a nova legislação do setor e a tributação. Em relação à tributação, trabalho da Ernst&Young, levando em conta tributos como Imposto de Renda, royalties (que em si não são tributo) e encargos de PIS/Confins/Pasep, mostra que o Brasil está em 1º lugar em matéria de maior tributação em cinco minerais diferentes. Em minério de ferro é o 3º, superado pela China, que não exporta, e a Venezuela que não produz quase nada. Então esta visão é míope: olha-se a árvore e não olha a floresta. Há aquela discussão sobre royalties entre os países, mas não se olha a carga total tributaria dele. Não se pode olhar apenas um item, mas o total da carga tributária.

Fonte: JB Online

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