E a América do Sul se fez
A estrutura geológica da América do Sul é um imenso caleidoscópio de blocos de rochas que se quebraram, se colaram e se movimentaram de modo impressionante. Em Pirapora do Bom Jesus, município a 60 quilômetros de São Paulo, o geólogo Colombo Tassinari, professor do Instituto de Geo-ciências (IGc) da Universidade de São Paulo (USP), exibe evidências dessas transformações, que dezenas de geólogos estudam em profundidade há pelo menos 50 anos e seu colega da USP Benjamim Bley Brito Neves sintetizou em um artigo recém-publicado na Journal of South American Earth Sciences. “Tudo isso aqui já foi o fundo do mar, há mais de 600 milhões de anos”, diz Tassinari, ao chegar ao alto de uma colina em um dos bairros do município de Pirapora do Bom Jesus.
Em seguida, ele para em um terreno de esquina margeado por amoreiras frutificando – em frente há uma escola municipal de paredes brancas e um mercadinho que vende baldes, bolas de plástico e sandálias havaianas. No barranco ao lado de uma rua asfaltada, Tassinari exibe uma dessas evidências: as pillow lavas, corpos de magma basáltico em forma de bolhas ou, como o nome sugere, de travesseiros.
“A camada mais externa das pillow lavas se formou quando a lava quente que brotou da crosta oceânica se resfriou ao encontrar a água do mar”, explica Tassinari, que trabalha com Bley e com outros geólogos para reconstruir a turbulenta – e inacabada – história geológica da América do Sul.
Há mais rochas desse tipo do outro lado do vale cortado pelo rio Tietê, aqui ainda bastante poluído, de águas escuras e lentas, cobertas com blocos brancos de espuma. Ao subir o morro ele já tinha mostrado um depósito natural de calcário e indicado a direção de uma antiga mina de magnetita – outros resquícios do fundo de um mar que se fechou como resultado do embate entre placas tectônicas que vinham em direções opostas.
A força das placas era intensa a ponto de fazer com que fragmentos de crosta oceânica que estavam a estimados 4 mil metros de profundidade fossem lançados para dentro do continente e se apresentem hoje a cerca de 600 metros de altitude (possivelmente já formaram morros ainda mais altos).
Pesquisadores da USP, Universidade de Brasília (UnB), Universidade Federal de Mato Grosso (UFMT) e de outros centros de pesquisa geológica do Brasil normalmente examinam a origem e a composição de partes desse imenso quebra-cabeça, por vezes oferecendo visões mais gerais como a de Bley.
Ao mesmo tempo, especialistas de outros países – Argentina, Estados Unidos, Espanha, Alemanha, Inglaterra, Dinamarca e Austrália – trabalham para entender a formação de seus próprios continentes.
Com frequência eles se encontram para se ajudar ou ver como os continentes se encaixavam, já que blocos de rochas hoje na América do Sul estiveram ao lado dos que hoje estão na América do Norte ou na China.
O artigo mais recente de Bley complementa outro, de 2008, publicado na revista Precambrian Research em conjunto com Reinhardt Fuck, da UnB, e Carlos Schbbenhaus, do Serviço Geológico Brasileiro.
Os dois trabalhos oferecem uma visão abrangente sobre a impressionante diversidade de idades, formas, tamanhos, composição e origens de blocos de rochas da crosta terrestre que vieram de direções diferentes, se encontraram, se empurraram, se amalgamaram ou se destruíram, consolidando o esqueleto geológico do continente sul-americano.
Blocos de rochas bastante antigos, com idade superior a 2,5 bilhões de anos, encontrados na Bahia e nas margens do rio Amazonas, se avizinham de outros, menos antigos, de cerca de 2 bilhões de anos, na Região Nordeste e em Mar del Plata, Argentina, e os mais jovens, de 500 milhões de anos, como a cadeia montanhosa da Mantiqueira, que começa no sul da Bahia e segue até o Uruguai. Essas camadas de rochas podem começar a poucos metros abaixo da superfície e chegar a 40 quilômetros de profundidade.
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